Paul Brown: mais do que uma entrevista, uma palestra

Paul Brown

Como você sabe, nós começamos uma série de entrevistas a algumas pessoas relevantes e também a empresas do setor. Mas isso tem sido especial, pois, como digo no título, Paul Brown Ele me propôs mudar a metodologia e fazê-lo como uma palestra. Finalmente decidi fazê-lo pelo Telegram, o que certamente dá um feedback que não tive a oportunidade de ter com o resto das entrevistas. Espero que gostem do resultado também ...

Quanto ao protagonista, não acho que muitas apresentações sejam necessárias, mas se ainda houver algum sem noção por aí, diga que Paul Brown é um dos editores de www.linux.com, é o fundador de Linux Espanha, e também escreve em seu próprio site Conserto rápido. Além disso, se você acompanhar de perto todo o megaprojeto KDE, certamente também saberá que ele é responsável pelas comunicações e também pelas promoções. Quer saber mais um pouco? Bem, continue lendo ...

PDP-8

LinuxAdictos: Você pode me dizer o que o levou de ser um professor de inglês para Linux? E qual foi o seu primeiro contato com software livre?

Paulo Brown: É claro. Ele sempre foi um entusiasta de computador. Eu programei um PDP-8 em 1979 e tinha um Commodore 64 em 1982. A outra coisa é que eu era um geek fora das revistas Linux. Quando as revistas Linux começaram a sair no final dos anos 90, fiquei muito intrigado e comprei todas. Era como um vírus: primeiro a tecnologia me infectou, depois a filosofia. Foi uma revelação de todas as coisas ruins que aconteceram aos computadores.

Quando um dia me peguei explicando aos meus alunos (em inglês) o que havia descoberto em vez dos usos do Present Perfect, percebi que precisava mudar de profissão.

LxW: A máquina DEC era de alguma empresa para a qual você trabalhava?

PB: Era de uma empresa têxtil, mas eu não trabalhava lá. Eu tinha apenas 13 anos! Eu estava no ensino médio. Um amigo dos meus pais foi o instalador e programador de toda a montagem. Havia um PDP-8 e um PDP-11. Enorme lixo, com discos rígidos (externos) do tamanho de uma máquina de lavar. O PDP-8 foi programado com um teletipo e você pode "armazenar" os programas em fitas de papel. Como estava tudo muito quente, o ar condicionado ficava o tempo todo ligado e só dava para entrar de jaleco branco para que os fios e a poeira das roupas não atingissem as máquinas. Tudo muito ficção científica da época ...

LxW: Muito interessante, não sabia das roupas ...

PB: Um amigo de meus pais disse que eles estavam exagerando um pouco. Mas, levando em consideração que todo o sistema valia milhões de pesetas na época ...

LxW: Agora que você fala daquelas máquinas antigas ... Não sei se você viu o documentário Code Linux, lembro que o pai de Linus Torvalds disse que a máquina onde seu filho teve seu primeiro contato com computadores facilitou seu aprendizado porque de sua simplicidade. Agora, talvez eles sejam complexos demais para entender como funciona. Está de acordo?

PB: Sim, mas há outra coisa. Eu mantenho um manual do Commodore 64 e no verso estão os projetos de todos os componentes eletrônicos internos. Os manuais eram muito abrangentes em tudo: explicavam todo o sistema operacional, aplicativos e hardware. Isso foi perdido. A maioria das máquinas que as pessoas compram são caixas pretas, sem qualquer documentação. Se na década de 80 os usuários eram convidados a mexer (foram-lhes dados os meios para isso), agora existem empresas que fingem fazer crer que isso é até ilegal.

Código fonte

LxW: Totalmente de acordo. É por isso que projetos como o Raspberry Pi e o Arduino penetraram tão bem no mundo educacional, certo? São muito mais simples, voltaram de alguma forma àqueles tempos e você encontra muita documentação ...

PB: Sim, na verdade o Raspberry Pi foi projetado por engenheiros que trabalharam em computadores pessoais (os "microfones" como eram chamados) dos anos 80. Eles perceberam que o fechamento do hardware transformava os computadores em quase eletrodomésticos.

Isso afetou a qualidade dos alunos matriculados em carreiras relacionadas à informática. Em outras palavras, os estudantes de ciência da computação dos anos 80 e início dos anos 90 sabiam muito mais do que aqueles que ingressam agora. E não é porque "todos os tempos passados ​​foram melhores", mas porque a indústria decidiu que quanto menos o usuário soubesse, melhor. É a idiotice da computação pessoal que levou a uma crise de talentos.

Não estou dizendo que democratização e simplificação sejam ruins, olho. Mas tem outro efeito que não pode ser ignorado. O que é ruim é esconder o que se passa lá dentro para quem está curioso.

LxW: Idiotização e desconfiança, além do que você menciona, também na desconfiança em termos de segurança e privacidade. Você não sabe realmente o que o software faz, mas nem o hardware ...

PB: E isso nos leva a coisas como Spectre e Meltdown: bugs e vulnerabilidades que existem nos sistemas desde os anos 90 e que pessoas como a Intel sabiam, mas não deveriam divulgar.

LxW: Você acha que o Raspi não teria uma CPU aberta também? Em vez de um IP central ARM ...

PB: Sim, claro. Irrita-me muito que não possamos ter hardware com todos os componentes abertos neste ponto do século. É uma questão pendente que a comunidade precisa resolver.

LxW: Passei 15 anos pesquisando microprocessadores e existem projetos interessantes como OpenSPARC, OpenPOWER, RISC, ...

PB: Existem vários projetos lá ... O RISC V parece promissor, mas no momento é mais um projeto do que qualquer outra coisa. Também estou um pouco ciente do OpenPOWER. Agh ... eu não sei o quão aberto isso é. Acho que é um passo nessa direção, mas até que você veja todos os diagramas distribuídos sob uma licença aprovada pela FSF ou OSI ...

LxW: Mudando um pouco do terceiro ... Que tal ver o boom dos videogames com suporte ao Linux?

PB: Hehe… Esse é um assunto que também tem seu lado negro. Por um lado, tudo bem. Portanto, todos aqueles que dizem "Não vou mais nos jogos" não terão mais desculpa. Por outro lado, a ideia do software livre não é criar ambientes que facilitem a distribuição de software proprietário. É um pouco parecido com o Android, sim, o kernel é gratuito, mas ninguém vai confundir o sistema com um sistema livre.

Será que para isso, que diferença faz se o kernel é gratuito ou não? É como quem defende isso quando teremos Microsoft Office ou Photoshop para Linux. Minha resposta é: 'Por favor, não'. Isso mataria projetos como o LibreOffice, ou GIMP, ou Kirta, ...

Mas admito que a coisa dos jogos é complicada. Eu posso entender como gerar negócios com software de escritório ou design grátis, você pode criar documentação, dar aulas, suporte técnico, mas no caso de videogames grátis ... Que outros negócios existem além de vender o jogo?

LxW: Isso me lembra de uma entrevista que fizemos com Richard Stallman, onde ele disse: "Se alguém usa o Visual Studio no GNU / Linux, é muito melhor do que usar o Visual Studio no Windows, porque o Windows não os envia mais." Você também pensa algo semelhante sobre videogames ...

PB: Sim, mas é um passo incremental muito menor do que as pessoas pensam. Mas ainda é um passo. Jogar jogos grátis em plataformas grátis ... isso seria um progresso claro.

LxW: E agora que citamos a Microsoft, o que você acha das últimas mudanças? Como a compra do GitHub, a abertura de certos projetos, a distro baseada em Linux, contribuindo com dinheiro e código para a Linux Foundation, o movimento mais recente em patentes ... Parece bom, mas quando você vê o Linux Sucks 2018, Bryan Lunduke diz algo que dá arrepios , sobre a estratégia da Microsoft de destruir por dentro: "Abraçar, estender, extinguir."

Microsoft Love ??? Linux

PB: É um pouco mais complexo do que isso. A Microsoft é uma grande empresa. Como tal, não pode fazer coisas boas ou más. Isso é antropomorfismo. Como qualquer grande empresa, como IBM, Red Hat ou qualquer outra, apenas seus acionistas respondem primeiro. Agora, os interesses da Microsoft se alinham (de certa forma) aos do Linux. Nada mais.

Na verdade, note que nenhuma dessas empresas nunca usa o termo "software livre", eles sempre usam "open-source", que não tem conotações morais. Isso mesmo: as empresas não podem ser creditadas com moralidade. Conclui-se que a Microsoft ama o Linux é puro marketing.

Vejamos, não tenho dúvidas de que existem engenheiros da MS que gostam de código aberto e que são bons cidadãos da comunidade, mas caem na falácia de que uma empresa, mais do tamanho da Microsoft, pode ter sentimentos ou uma moralidade, é delirante. Tenha cuidado, eu penso o mesmo sobre Red Hat, IBM, Samsung e tudo o mais ...

Além disso, se você pensar assim, nunca ficará desapontado quando eles fizerem algo com que você não concorda. O raciocínio por trás de sua motivação é sempre simples: 'Com isso eles conseguiram aumentar o valor de suas ações'. Isso é tudo. É toda a justificativa de que você precisa. É por isso que eles precisam ser regulamentados até a morte. Na verdade, não acho que nenhuma empresa deva se permitir crescer e acumular tanto poder quanto uma Microsoft, Google, Apple, Amazon ...

LxW: Sim, infelizmente a regra dos acionistas, tenho visto muitas empresas mudarem de rumo, mesmo ao custo de passar seus próprios funcionários ou engenheiros só porque o dinheiro vai para outro setor. Por exemplo, estou me lembrando da AMD, quando os acionistas viram um mercado potencial para dispositivos móveis e de baixo consumo de energia e quiseram sacrificar o desempenho para reduzir o consumo de energia, e houve uma corrida de engenheiros da velha guarda. E isso fez com que a empresa se ajoelhasse diante da Intel até a chegada do Zen, quando recuperou um bom punhado de bons arquitetos. Mas eu me pergunto o que vem primeiro, a galinha ou o ovo? Quer dizer, para esses acionistas moverem uma guia, deve haver uma cenoura na frente deles que os incentive a fazê-lo ... Steve Jobs era um mágico nisso, gerando uma necessidade e depois explorando-a ...

PB: Cara, gerar necessidade é meio contraditório em termos, né? Não quero filosofar, mas ter um iPad não é uma necessidade.

LxW: Sim, mas eles fazem você acreditar que, se você não tiver, você não é "legal". Na verdade, existem muitas escolas que querem que seus alunos trabalhem com iPads e não com qualquer tablet, obrigando os pais a fazerem um grande dispêndio de dinheiro e todas as outras coisas que isso acarreta ... Se você carrega um tablet Android, você vai ser a esquisita da turma ou nem vai conseguir trabalhar, isso é criminoso. Além disso, se você se acostumar com isso, vai querer isso ... Também há estudos que dizem que o iPhone se tornou um dos indicadores do nível econômico atual. E as pessoas se matam por tê-los ...

PB: … O software livre poderia usar um pouco daquele… er… glamour. E que as pessoas pensaram que instalar o Arch ou o Debian é para ser o mestre. É isso…

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Entrevistas Linux

Muito obrigado por tudo Paul, um prazer… Espero que os leitores tenham achado essa entrevista interessante. Não se esqueça de deixar o seu comentários.


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  1.   Rafa GCG dito

    Muito interessante. Obrigado